Simples Nacional vs. Lucro Presumido/Real Pós-Reforma: Análise Comparativa para a Escolha do Regime

Reavalie seu regime tributário pós-Reforma. Simples Nacional, Lucro Presumido ou Real? Saiba como a regra do crédito B2B afeta sua competitividade e lucro.

9/22/20257 min read

A aprovação da Reforma Tributária do Consumo no Brasil, com a introdução do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), representa a maior transformação fiscal das últimas décadas.

Para as Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP) optantes pelo Simples Nacional, a mudança não significa o fim do regime, mas sim uma profunda alteração no cenário competitivo em que estão inseridas.

A regra do jogo mudou drasticamente, e a escolha do regime tributário — Simples Nacional, Lucro Presumido ou Lucro Real — deixou de ser uma mera questão de cálculo de alíquotas e se tornou uma decisão estratégica que pode definir a sobrevivência e a expansão de um negócio.

Este artigo aprofunda a análise comparativa entre os regimes, com foco especial no impacto da nova dinâmica de crédito tributário, crucial para as operações Business-to-Business (B2B).

1. O Novo Paradigma Tributário: A Regra do IVA e o Crédito como Moeda

A essência da Reforma Tributária é a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual (IBS e CBS), substituindo o PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. A principal característica do IVA é a não cumulatividade plena.

Em um sistema de IVA, o imposto incide sobre o valor de cada transação, mas o empresário pode se creditar do imposto pago nas etapas anteriores (insumos, materiais, serviços). O imposto só é pago sobre o "valor adicionado" pela empresa.

Imagine o imposto como uma moeda de troca. Se você vende para uma grande empresa, ela só estará disposta a pagar o valor total se puder usar o imposto embutido como crédito para abater de suas próprias obrigações.

Neste novo paradigma, a capacidade de gerar crédito para o seu cliente torna-se um fator de competitividade ou, na sua ausência, de profundo desinteresse comercial.

A questão crucial é que, embora o Simples Nacional mantenha sua sistemática de recolhimento simplificado, ele interage de forma complexa com este novo sistema de créditos.

2. O Simples Nacional e a "Desvantagem B2B" no Pós-Reforma

O Simples Nacional foi criado para simplificar o recolhimento de impostos para MPEs, unificando diversos tributos em uma única guia (DAS) e aplicando alíquotas menores sobre o faturamento.

Historicamente, o principal efeito colateral deste benefício é a vedação ao crédito integral para quem adquire mercadorias ou serviços do optante pelo Simples.

A Manutenção da Vedação ao Crédito

A Reforma Tributária, tal como desenhada na Emenda Constitucional, mantém a regra geral de que o Simples Nacional não será onerado com o IBS e a CBS na forma tradicional. No entanto, o seu cliente (no caso de vendas B2B) não poderá se creditar de todo o imposto que estaria embutido na operação, como ocorreria se comprasse de uma empresa do Lucro Presumido ou Real.

Com a implantação do IVA, essa "desvantagem B2B" será exponenciada.

O Cálculo do Crédito Proporcional

Para mitigar o problema, foi estabelecido que o comprador de uma empresa do Simples terá direito a um crédito presumido. Este crédito é calculado de forma a corresponder ao valor do IBS e da CBS que teoricamente estariam embutidos no DAS do fornecedor, limitado à alíquota do Simples.

O Problema Prático:

  1. Complexidade: O cliente precisa calcular este crédito proporcional com base nas faixas de faturamento do fornecedor, o que adiciona burocracia.

  2. Perda Financeira: O valor do crédito presumido é sempre inferior ao crédito integral que o cliente obteria se comprasse de uma empresa do Lucro Real (onde o crédito é de 100% do imposto destacado).

Na prática, para uma grande indústria que adota o Lucro Real, comprar de um fornecedor do Simples Nacional significa abrir mão de parte do seu crédito tributário, o que se traduz em um custo extra para essa indústria.

É natural que as grandes empresas passem a priorizar fornecedores que lhes garantam o crédito integral do IBS e CBS. O empresário do Simples Nacional que vende B2B (insumos, peças, serviços recorrentes) enfrentará:

  • Pressão por Preços: O cliente exigirá descontos correspondentes à perda de crédito.

  • Perda de Mercado: Dificuldade em fechar novos contratos com grandes players.

3. Alternativas para o Optante do Simples: A Opção do Regime Híbrido

Para tentar resgatar a competitividade do Simples no mercado B2B, a Reforma previu a possibilidade do Regime Híbrido.

O Que é o Regime Híbrido?

O Regime Híbrido é uma opção para as empresas do Simples Nacional que permite a elas recolher o IBS e a CBS na forma do regime geral de IVA (não cumulativo), separadamente dos demais tributos federais e previdenciários, que continuam no DAS simplificado.

As Implicações Desta Opção:

  • Competitividade B2B: Ao recolher o IBS/CBS "por fora" do DAS, a empresa do Simples destaca o imposto na nota e, mais importante, transfere o crédito integral para seu cliente.

  • Fim da Simplificação: Essa opção anula a simplificação para os impostos de consumo (IBS e CBS). A empresa passa a ter que apurar esses tributos pelo regime não cumulativo, exigindo:

    • Controle detalhado de entradas e saídas.

    • Cálculo complexo de créditos (créditos de insumos, energia, etc.).

    • Novas obrigações acessórias.

  • Avaliação de Carga: A empresa deve comparar se o custo da burocracia e a nova alíquota de IBS/CBS (que pode ser maior do que a alíquota embutida no DAS) compensam o ganho de competitividade e a retenção de clientes B2B.

A adoção do Regime Híbrido é, na prática, um passo em direção à migração, ao aceitar a complexidade do IVA, mas mantendo a simplificação para IRPJ, CSLL e CPP. É um cenário intermediário que exige extremo cuidado na análise.

4. Lucro Presumido e Lucro Real: O Novo Poder de Geração de Créditos

Os regimes tributários tradicionais (Lucro Presumido e Lucro Real) são os verdadeiros beneficiários da simplificação e da modernização do sistema de impostos sobre o consumo.

Com a plena não cumulatividade do IBS e da CBS, a figura do crédito tributário é desburocratizada e universalizada.

Vantagens dos Regimes Tradicionais no IVA:

  • Crédito Pleno: Tanto o Lucro Presumido quanto o Lucro Real podem se creditar integralmente do IBS e da CBS pagos na aquisição de quase tudo: insumos, energia elétrica, aluguel, serviços de telecomunicação, etc.

  • Vendas B2B Sem Barreira: Vender para outra empresa que está no Lucro Real ou Presumido (no novo regime de IVA) significa garantir o crédito integral ao seu cliente, tornando sua operação transparente e competitiva em preço.

  • Fim da "Guerra Fiscal": Com a alíquota de destino e a padronização federal, a burocracia de ICMS e ISS (que ainda afeta o Presumido e o Real no sistema antigo) será drasticamente reduzida.

A Diferença entre Presumido e Real Pós-Reforma

A escolha entre Lucro Presumido e Lucro Real continuará a depender da margem de lucro da empresa.

Em essência, ambos se tornam competitivos no B2B, mas o Lucro Real será o regime que mais se beneficia da não cumulatividade (incluindo o crédito do IBS/CBS sobre aquisições) e, portanto, o regime mais vantajoso para a maioria das indústrias e atacadistas.

5. Análise de Cenário: Quando o Simples Continua Sendo a Melhor Opção

Apesar dos desafios no B2B e da simplificação do IVA, o Simples Nacional manterá sua relevância para um conjunto significativo de micro e pequenos negócios.

O Simples Nacional continua sendo imbatível em cenários específicos, principalmente porque a unificação do DAS inclui a Contribuição Patronal Previdenciária (CPP), um custo muito alto nos regimes tradicionais.

O Simples é, e continuará a ser, o regime mais vantajoso para empresas com as seguintes características:

A. Vendas Predominantes para o Consumidor Final (B2C)

Se a maioria das suas vendas é para Pessoas Físicas, a questão do crédito tributário é irrelevante. O consumidor final não aproveita crédito.

Neste caso, o benefício de ter alíquotas reduzidas e simplificadas, especialmente a inclusão da CPP no DAS, supera a complexidade e a carga fiscal dos demais regimes. O custo de oportunidade de não gerar crédito é zero.

B. Empresas com Alto Custo de Folha de Pagamento

A CPP (INSS Patronal) no Lucro Presumido/Real é de 20% sobre a folha de salários.

No Simples Nacional, a CPP está embutida nas alíquotas finais do DAS, em percentuais que costumam ser muito menores do que 20% sobre a folha, dependendo do Anexo e da faixa de faturamento.

Regra de Ouro: Quanto maior a proporção dos gastos com folha de pagamento em relação ao faturamento total, maior é a chance de o Simples Nacional continuar sendo o regime mais econômico (especialmente nos Anexos com menor impacto de CPP, como o Anexo III de Serviços).

C. Empresas com Baixo Faturamento e Alta Margem de Lucro (Em Início)

Para empresas que estão começando ou têm um faturamento abaixo de R$ 180.000,00 por ano, as alíquotas iniciais do Simples são extremamente baixas e a burocracia é mínima.

Nesses casos, a carga tributária é tão insignificante que o custo de contratar um contador para apurar um regime mais complexo (Real) ou a alíquota cheia do Presumido simplesmente não compensam.

6. A Decisão Estratégica: Fatores-Chave para a Reavaliação do Regime

A migração de regime tributário não deve ser um ato impulsivo, mas sim o resultado de um estudo aprofundado de Planejamento Tributário.

Se a sua empresa está no Simples Nacional e você se preocupa com a competitividade pós-Reforma, siga este checklist de análise em conjunto com seu contador:

Conclusão: O Imperativo da Adaptação

A Reforma Tributária não é uma ameaça ao Simples Nacional, mas um divisor de águas na forma como as empresas de pequeno porte se relacionam com o mercado. O regime simplificado continua sendo o pilar da pequena empresa brasileira, mas a inércia será punida.

O empresário que vende majoritariamente para o consumidor final (B2C) e tem uma folha de pagamento robusta pode respirar aliviado, pois o Simples Nacional continuará a ser sua fortaleza fiscal.

No entanto, o empresário B2B deve agir rapidamente, fazendo simulações precisas. O crédito tributário é o novo diferencial competitivo. Ignorá-lo é dar vantagem aos concorrentes que já estão no Lucro Presumido ou Lucro Real, ou àqueles que migrarem.

O momento exige um aprofundamento da parceria com o seu contador. A decisão não é binária, mas multifacetada, e a escolha correta do regime tributário pode ser o seu maior ato de planejamento estratégico para os próximos anos.

Sua empresa já realizou uma simulação com a alíquota de IBS/CBS projetada para a sua atividade? Este é o ponto de partida.